Power Of Siberia

No início de setembro, os olhos do mundo voltaram-se para Pequim, onde Xi Jinping recebeu Vladimir Putin num encontro marcado por um grande desfile militar que procurou transmitir uma imagem de força e união. Para além do simbolismo político e das mensagens dirigidas ao Ocidente, a cimeira destacou-se pelo avanço de um projeto que pode transformar profundamente a economia global: o gasoduto Power of Siberia 2, pensado para transportar quantidades exorbitantes de gás natural da Sibéria diretamente para a China. Esta iniciativa mostra não apenas o reforço das ligações entre Moscovo e Pequim, mas também o realinhamento estratégico da Rússia, que procura novos mercados após as sanções impostas pela União Europeia, ao mesmo tempo que oferece à China a possibilidade de garantir energia abundante e a preços mais acessíveis.

O impacto deste projeto para a Europa é imediato e significativo. Ao garantir um comprador alternativo de peso para o seu gás, a Rússia reduz a sua dependência do mercado europeu e, com isso, diminui também a eficácia das sanções energéticas ocidentais. Para os consumidores e empresas europeias, a consequência pode ser um aumento do preço da energia, uma vez que a necessidade de recorrer a alternativas, como o gás natural liquefeito (GNL) importado por via marítima, implica custos superiores. A fragilidade da coesão política interna da União Europeia torna-se ainda mais evidente, uma vez que alguns países, dependentes da energia russa, continuam a resistir a medidas mais duras contra Moscovo, criando divisões, num momento em que a união entre os estados-membros seria essencial.

Os efeitos, no entanto, vão muito além das fronteiras europeias. A aproximação energética entre Rússia e China tende a aumentar a volatilidade nos preços globais do petróleo e gás, já que os mercados reagem não apenas a contratos assinados, mas também à perceção de instabilidade. Além disso, a consolidação deste eixo energético no Oriente está a redesenhar as cadeias de fornecimento globais, obrigando países e empresas a repensar rotas e estratégias de abastecimento. Outro ponto relevante é o impulso à chamada desdolarização parcial: ao optarem por realizar transações em rublos e yuans, Moscovo e Pequim enviam um sinal de que procuram reduzir a influência do dólar no comércio internacional, tendência que, embora não ameace de imediato a moeda americana, contribui para um lento, mas contínuo e visível processo de diversificação no sistema financeiro global.

Mais do que uma infraestrutura de transporte de gás, o Power of Siberia 2 tornou-se num símbolo da transformação geopolítica em curso. Para a Rússia, representa a libertação progressiva da dependência europeia; para a China, é a consolidação do seu papel como parceiro indispensável numa ordem internacional em mudança. Para a Europa, pelo contrário, o desafio torna-se ainda mais urgente: acelerar a transição energética e diversificar fornecedores ou arriscar-se a enfrentar custos mais elevados e perda de competitividade. A cimeira de Pequim mostrou, de forma clara, que a energia continua a ser um dos recursos mais poderosos na definição do futuro da economia mundial.

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